sábado, 21 de outubro de 2017

Discurso do Papa Francisco durante o Simpósio da Família Vicentina, Roma 2017



Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Obrigado pela sua calorosa recepção e agradeço ao Superior Geral pela abertura de nosso encontro.

Saúdo-os e me uno a vocês para render graças ao Senhor pelos 400 anos de vosso carisma. São Vicente gerou um impulso de caridade que dura séculos: um impulso que brotou de seu coração. Por isso, hoje temos aqui a relíquia: o coração de São Vicente. Hoje, gostaria de incentivá-los a seguir este caminho, propondo três verbos simples que acredito ser muito importantes para o espírito vicentino, mas também, para a vida cristã em geral: adorar, acolher e ir.

Adorar.  São inúmeros os convites de São Vicente a cultivar a vida interior e a dedicar-se a oração que purifica e abre o coração. A oração é especial para ele. É a bússola de todos os dias, é como um manual da vida, é – escrevia – “o grande livro do pregador”: Somente rezando se consegue de Deus o amor que deve ser derramado no mundo; somente rezando se consegue tocar os corações das pessoas ao anunciar-lhes o Evangelho (ver Carta a A. Durand, 1658). Mas para São Vicente a oração não é apenas um dever, e menos ainda um conjunto de fórmulas. A oração é parar diante de Deus para estar com Ele, para dedicar simplesmente a Ele. Está é a oração mais pura, a que deixa espaço para o Senhor e ao seu louvor, e nada mais: a adoração. 

Uma vez descoberta, a adoração se faz indispensável, porque é pura intimidade com o Senhor, que dá paz e alegria, e derrete as banalidades da vida. Por isso, São Vicente aconselhava a quem estivesse sob uma pressão particular, que permanecesse em oração “sem tensão, lançando-se em Deus com olhar simples, sem tentar ter sua presença com um esforço considerável, mas se abandonando n’Ele” (Carta a G. Pesnelle, 1659).

Esta é a adoração: colocar-se diante o Senhor, com respeito, com calma e em silêncio, dando-lhe o primeiro lugar, abandonando-se com confiança. Para pedir depois que seu Espírito venha a nós e deixar que nossas coisas irem a Ele. Assim, também as pessoas necessitadas, os problemas urgentes, as situações difíceis e pesadas entram na adoração, tanto é que São Vicente pedia que se “adorassem em Deus, inclusive as razões que são difíceis de compreender e aceitar” (ver Carta a F. Get, 1659). Aquele que adora, aquele que vai à fonte viva do amor, não pode pelo menos, por assim dizer “contaminar-se”. E começa a se comportar com os outros como o Senhor se comporta com ele: ele se torna mais misericordioso, mais compreensivo, mais disponível, supera sua dureza e rigidez e se abre aos outros. 

Chegamos ao segundo verbo: acolher. Quando escutamos essa palavra, imediatamente pensamos em algo que fazer. Mas, na realidade, acolher é uma disposição mais profunda: não se trata somente de abrir espaço a alguém, mas sim de ser pessoas acolhedoras, disponíveis acostumadas a se dar aos outros. Como Deus para nós, assim nós aos outros. Acolher significa redimensionar o próprio eu, endireitar a forma de pensar, entender que a vida não é minha propriedade privada e que o tempo não me pertence. É um desapego lento de tudo o que é meu: meu tempo, meu descanso, meus direitos, meus programas, minha agenda. Aquele que acolhe renuncia ao eu e faz entrar em sua vida o tu e o nós. 

O cristão acolhedor é um verdadeiro homem e mulher da Igreja, porque a Igreja é Mãe e uma mãe acolhe e acompanha a vida. E como um filho que se parece com a sua mãe, nos traços, assim o cristão tem estes traços da Igreja. Então é um filho verdadeiramente fiel à Igreja, que é acolhedora, que, sem reclamar, cria concórdia e comunhão e semeia, generosidade, a paz, mesmo que não seja correspondida. Que São Vicente nos ajude a promover este “DNA” eclesial de acolhida, da disponibilidade e da comunhão, para que desapareçam de nossas vidas “qualquer aspereza, desdém, raiva, gritaria, insulto, e todo tipo de maldade.” (Efésios 4,31).

O último verbo: ir. O amor é dinâmico, sai de si mesmo. Aquele que ama não fica numa poltrona olhando, esperando pelo advento de um mundo melhor, mas com entusiasmo e simplicidade se levanta e vai. São Vicente dizia muito: “Portanto, nossa vocação é ir, não a uma paróquia, nem apenas a uma diocese, mas a toda a terra. E para fazer o que? Para inflamar os corações dos homens, fazendo o que fez o Filho de Deus, Ele, que veio trazer fogo ao mundo, para inflamá-lo com seu amor” (Conferência de 30 de maio, 1659). Essa vocação é sempre válida para todos. Faça essas perguntas a você mesmo: Saio ao encontro dos outros, como quer o Senhor? Levo onde vou este fogo de caridade ou me fecho para me aquecer diante da minha lareira? 

Queridos irmãos e irmãs, obrigado porque estão em movimento pelos caminhos do mundo, como São Vicente lhes pediria hoje também. Desejo que vocês não parem, mas que prossigam tirando da adoração de cada dia, o amor de Deus e que espalhem por todo o mundo através do bom contágio da caridade, da disponibilidade, da concórdia. Abençoo a todos vocês e aos pobres que encontrem. E, por favor, os peço a caridade de que não se esqueçam de rezar por mim.

Papa Francisco  

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